Desde que desevitei os sabores de um bom paladar passei a freqüentar o supermercado menos até que o habitual - que graça tem perdurar o olhar na vitrina de colares da loja na qual você pode entrar e comprar quaisquer colares e brincos de dentro? Nesse caminho em que se ajeitaram as coisas é que eu andava por aí, pensando que andava numa esteira rolante prestes a chegar a lugar algum, mas -surpresa!- cheguei a tão inesperada véspera.
E em toda a véspera vou ao mercado. Não que marque na agenda um horário pra fazer isso, não, são aquelas visitas surpresa, emergenciais, do tipo: "Pai, esquecemos de comprar o panetone de chocolate do vô e o granulado da sobremesa!" E então lá vou eu enfrentar as bregas músicas de Natal de trilha sonora enquanto procuro apressada pelos detalhes finais que tentam estragar os arranjos já preparados. 'Se bem que gosto desse espírito natalino', penso eu quando já estou no caixa, até porque parece que todos resolveram partilhar o esquecimento de última hora comigo - a fila está enorme. Não tem problema, enquanto isso assisto às crianças ansiosas para ver o Papai Noel à noite, aos casais comprando champagne para um Natal romântico, às famílias fazendo compras juntas pela primeira vez no ano. É claro que na véspera as pessoas também estão mais solidárias, estamos todas vivendo um mesmo momento juntos, porque não conversar com a pessoa da fila? - Boa sorte pra você! Brigada, pra você também! E na saída a garoa fina e gelada, a única possível neve do nosso verão, fazia as luzinhas decorativas brilharem mais, e a rua parecia uma aconchegante ambiente familiar. E cantei alto, ninguém me ouvia, afinal, é Natal - dali a um mês.
Chegou a véspera. Algum dia ela chegaria. - "Pai, esqueci de comprar água mineral, caneta preta e maracujá pra conseguir dormir!" E lá fui eu. Deixei a ansiedade no caminho e me senti mais na véspera de Natal que do vestibular, há algo de mágico nos dois que me move do mesmo jeito: esperança. E por sorte encontrei alguém por lá pra me dar boa sorte - troquei alguns minutos do dia 28 de novembro por uns do 24 de dezembro, quanta sorte.
Boa sorte se você for fazer vestibular também. E boa véspera.
sábado, 28 de novembro de 2009
sexta-feira, 20 de novembro de 2009
Carnaval em novembro
As gotas de chuva viraram confetes coloridos,
serpentinas serpentearam a faixa de pedestres;
o palhaço que entrou na moda de repente,
o caminhão que virou trio elétrico,
o policial que já estava fantasiado,
os carros que ligaram o som da bateria
e nas vitrinas das lojas as perucas e lantejoulas que enfeitavam:
- É Carnaval em novembro!
A Colombina aproveitou o retorno do momento
pra deixar Pierrot e procurar Arlequim,
dançando enquanto mandava abrir alas que queria passar;
escorregou na casca de banana nanica
que a Xiquita Bacana tinha tirado,
essa que vestia um pano de prato suspeito e engraçado.
Levantou a Colombina, quem diria,
o Zezé, que nada era do que suspeitavam:
chamou a Maria Bonita pra largar o café a ser feito
e dançar um balançê com ele no tititi do tráfego.
Tinha bailarina e soldado de chumbo,
malabaris gringo e roda de baiana;
Tinha pipa e um céu de sol que até o vovô se animou.
O pouco virou festa de repente,
pulamos o Natal e o ano novo que ano que vem tem tudo de novo,
amanhã ainda é novembro
e nosso carnaval não acabou.
serpentinas serpentearam a faixa de pedestres;
o palhaço que entrou na moda de repente,
o caminhão que virou trio elétrico,
o policial que já estava fantasiado,
os carros que ligaram o som da bateria
e nas vitrinas das lojas as perucas e lantejoulas que enfeitavam:
- É Carnaval em novembro!
A Colombina aproveitou o retorno do momento
pra deixar Pierrot e procurar Arlequim,
dançando enquanto mandava abrir alas que queria passar;
escorregou na casca de banana nanica
que a Xiquita Bacana tinha tirado,
essa que vestia um pano de prato suspeito e engraçado.
Levantou a Colombina, quem diria,
o Zezé, que nada era do que suspeitavam:
chamou a Maria Bonita pra largar o café a ser feito
e dançar um balançê com ele no tititi do tráfego.
Tinha bailarina e soldado de chumbo,
malabaris gringo e roda de baiana;
Tinha pipa e um céu de sol que até o vovô se animou.
O pouco virou festa de repente,
pulamos o Natal e o ano novo que ano que vem tem tudo de novo,
amanhã ainda é novembro
e nosso carnaval não acabou.
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
Ela
Uma - Sabe o que eu queria? Ser auto-suficiente como ela.
Outra - Mas você é alta o suficiente.
Uma - Mas não como ela. Ela, sei lá, é tão cheia de si.
Outra - Cheia? É, no máximo cheinha, eu diria que tá mais pra violão.
Uma - Sim, ela sabe, piano, violão, flauta-doce.
Outra - Ah, duvido que passe algum doce por aquela garganta.
Uma - Passa sim, não ouve que a voz dela é doce como a de uma fada?
Outra - Falando em passar, olha ela lá passando, cheia de graça!
Uma - É mesmo, ela passou em todos os concursos pelos quais concorreu e ainda nunca perde a humildade...
[Sempre achei que a inveja era duas caras].
Outra - Mas você é alta o suficiente.
Uma - Mas não como ela. Ela, sei lá, é tão cheia de si.
Outra - Cheia? É, no máximo cheinha, eu diria que tá mais pra violão.
Uma - Sim, ela sabe, piano, violão, flauta-doce.
Outra - Ah, duvido que passe algum doce por aquela garganta.
Uma - Passa sim, não ouve que a voz dela é doce como a de uma fada?
Outra - Falando em passar, olha ela lá passando, cheia de graça!
Uma - É mesmo, ela passou em todos os concursos pelos quais concorreu e ainda nunca perde a humildade...
[Sempre achei que a inveja era duas caras].
terça-feira, 10 de novembro de 2009
oirártnoC oA
Um final feliz tristonho,
cansado de ser feliz pra sempre,
partiu do Reino Tão Tão Distante,
à galope num cavalo branco,
pra pegar o sapato de cristal da princesa antes do príncipe,
e impedir uma vez que era pra ser.
[H0menagem a um dia em que não pus as mãos nos sapatos e os pés na maçaneta - e deixei de encontrar o mundo, na rua, tal como deveria ser].
cansado de ser feliz pra sempre,
partiu do Reino Tão Tão Distante,
à galope num cavalo branco,
pra pegar o sapato de cristal da princesa antes do príncipe,
e impedir uma vez que era pra ser.
[H0menagem a um dia em que não pus as mãos nos sapatos e os pés na maçaneta - e deixei de encontrar o mundo, na rua, tal como deveria ser].
domingo, 1 de novembro de 2009
Querendo despir o mundo
Saí dos prantos e peguei carona com uma corrida arfante: a vinda fugida de um modo simples do complicado, do horizonte encarcerado numa roda morta de pavimentos. O mundo não sabia - queria desnudá-lo: as placas que levam todos a caminhos inventados fincavam nas flores as falsas, os acrílicos, as tintas, as plásticas-pétalas. E a chuva não levava o pesar jogado no ar, enquanto o vento tentava escapar do túnel para soprar uma melodia sem arranjos. Luzes que competiam com a lua enchida de tanto o sol ser estrela cobriam o amor que piscava na freqüência dos meus pulsos - balanço acelerado na tarde que também vermelha fingia ser. Pela noite corria vendo a alegria alheia que lhes atribuíram, dos sorrisos aos entorpencentes enlatados, pois sabia que o fim prometia me entregar uma toalha seca numa voz grave desmetaforizada e me olhar de olhos azuis de verdade - nossos olhares para a ver a vida absoluta era naquele só lugar. Nós e o mundo, despidos como tivéssemos estado num baile de máscaras.
Assinar:
Postagens (Atom)