Senti-me como se todos os seus beijos tivessem roubado as palavras dos meus lábios. Foi como se tivéssemos tomado sorvete à luz de velas, sopa com garfos, sushis sem palitos e burritos sem pratos. Pensei que aquele inverno congelara todos nossos passos; viráramos duas figuras no quadro de um Picasso, deixando pelas janelas a lua cheia naquela noite minguante entrar no nosso quarto. Parecia que o abraço vinha só do seu casaco, que as fotografias da praia nos porta-retratos eram lápides na estante de cupins e de livros pesados.
Tentei me ajeitar no travesseiro, cantarolar uma canção, virar o copo inteiro, pegar na sua mão, mas era como se as cinzas da lareira tornassem tudo pedras; procurei por suas pernas mas também não encontrei. Só o que pude ver foi a sombra dos seus cílios se movendo como asas no tempo periódico, no qual me perdi pensando em nada pra não ter que te dizer. Era como se o seu toque me tirasse o tato; seu perfume, meu olfato; sua razão, meu sentido; seu corpo, minha libido; fechei os olhos pra me entregar naquela inércia sem falas e sem rostos, te deixando só o apagar das luzes e dos nossos sonhos.
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